NATAL

É véspera de natal.
A casa, em outras épocas tão vazia, se encontra agora lotada de parentes, vindos de longe, a maioria da capital.
A família conversa, toma mate e conta causos.
O garoto olha tudo e todos com certa distância e resguardo.
O clima é de festa e contentamento, mas de vez em quando:
_ Bah! Mas esse guri é desajeitado!
Fala alguém referindo-se a ele.
Admira a família, mas tem grande receio de envolver-se com ela.
À noite todos cantam e dançam músicas típicas da época, porém ele ruma para um canto escuro no pátio, onde só se enxerga a lua e as estrelas. Acompanhado de um pequeno rádio, ouvindo Renato Russo, ele viaja através da música, enquanto se despedaça lentamente, quando é surpreendido por aquele que é seu maior ídolo, e também aquele que mais o humilhou em frente a outras pessoas, seu padrinho.
_ Vamos lá pra dentro! O ambiente lá ta bom!
Convida o homem.
O garoto faz apenas um sinal com a cabeça indicando que não.
Percebendo que a situação é mais grave, o padrinho, um homem maduro e bem vivido, bem resolvido financeiramente e amorosamente, resolve sentar-se ao lado do garoto e começa a contar histórias para tentar levantar sua auto-estima.
Depois de muito tentar, o homem consegue levar o garoto para dentro da festa e mudar-lhe a expressão.
E sabem o que ele usou para convencê-lo?
Nada de mais!
Apenas contou sua história.
Por mais incrível que fosse, ele também sofria, também tinha aflições e dúvidas existenciais, porém, nunca havia contado isso para ninguém, pois descobriu ser melhor fingir falsos sorrisos, até os verdadeiros aparecerem.

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